Já se vão 15 anos dos eventos fraudulentos ocorridos em grandes empresas globais como ENRON, WORLDCOM e XEROX, que influenciaram profundamente os mercados mundiais. Nos Estados Unidos, por exemplo, as fraudes resultaram na lei Sarbannes Oxley, apelidada de SOX, que se tornou a referência internacional de padrão de boa governança corporativa.
Logo
após estes eventos, surge no Brasil o Novo Mercado da BOVESPA (atual
BMF-BOVESPA), que introduz melhores práticas no nosso mercado de capitais, ao criar
os segmentos de listagem mais rigorosos, componentes do chamado Novo Mercado.
Até então, a maior parte das empresas não possuía políticas de proteção dos
interesses dos acionistas minoritários, notadamente os investidores pessoas
físicas.
Pensava-se
que haveria poucas empresas dispostas a pagar o preço de se implantar uma gama
maior de garantias que, obviamente, custariam mais caro. Mas o que ocorreu? O
mercado se autorregulou, tendo sido criado um movimento no qual ficou evidente
que uma empresa que quisesse fazer uma abertura de capital de sucesso precisava
fazê-lo já no “novo mercado”, pois as melhores práticas de governança eram
requisitos de atratividade para os investidores.
Mas qual a relação destes fatos com a atual
realidade e as pequenas e médias empresas?
O
que vem ocorrendo de positivo desde então é que, cada vez mais, as pequenas e
médias empresas também sofrem uma pressão do mercado para buscar o
aperfeiçoamento de sua gestão. E em todos os sentidos, desaguando na aplicação
dos conceitos da governança corporativa, antes restrita às companhias abertas e
fechadas de grande porte.
Os
princípios norteadores da Governança são todos aplicáveis ao universo de
qualquer empresa e até mesmo de uma organização governamental ou do Terceiro
Setor, são eles:
Transparência:
Não apenas o dever de informar, mas o desejo de pró-ativamente levar ao
conhecimento de todos os stakeholders os fatos mais importantes
envolvendo a empresa;
Equidade:
Tratar todos os públicos de forma equânime e justa, de maneira a evidenciar a
boa-fé da empresa;
Prestação
de Contas: Correlacionado com a transparência, evidencia o dever de executar a
missão da empresa e demonstrar aos respectivos públicos envolvidos o que foi
realizado;
Responsabilidade
Corporativa: As obrigações da empresa envolvem não apenas os acionistas mas
toda a sociedade, devendo a mesma, portanto, ter visão de longo prazo, o
compromisso com a sustentabilidade planejando a perenização da organização no
tempo.
Mais
recentemente, este ultimo princípio tem sido traduzido na prática pela busca da
“conformidade”, tradução para o termo em inglês “COMPLIANCE”
que, em síntese, visa que a empresa esteja sempre cumprindo com todas as regras
que a ela se aplicam, sejam tratados internacionais, leis do país onde se
situa, normas reguladoras setoriais, as próprias regras internas formalizadas
com seus colaboradores e os contratos com os stakeholders.
No
Brasil, este tema não é novo, mas andava esquecido até que, em 2013, foi
publicada a Lei 8243, alcunhada de “Lei Anticorrupção”, a qual foi regulamentada
em 2015 pelo Decreto 8240.
Tais
normas, apesar de, aparentemente, terem um foco de Direito Administrativo,
trazem conteúdos que impactam a realidade de todas as empresas privadas, sejam
elas pequenas, médias, grandes e até mesmo as chamadas startups.
É
que elas introduzem a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica por atos de
seus administradores ou prepostos. Significa, de forma simples, permitir
imputar a responsabilidade civil e penal da empresa por atos de tentativa de
fraude e corrupção, independente de se demonstrar a culpa (negligência,
imperícia ou imprudência) do Sócio-Diretor ou Executivo contratado.
E o que este fato tem a ver com a Governança
Corporativa? Tudo! Explico:
O
Decreto 8240 traz, em seu texto, a recomendação de que as empresas criem no seu
ambiente interno, “escritórios de integridade”, voltados a buscar o “compliance” da sua atuação
em relação às legislações aplicáveis à mesma, independente do setor de atuação.
E
o mesmo Decreto determina que a forma de mitigar, ou seja, reduzir o risco de
responsabilidade dos administradores em caso do envolvimento da empresa em uma
denúncia de corrupção é a utilização de evidências documentais obtidas através
dos procedimentos de controle decorrentes da implantação do referido programa
de integridade ou “compliance”.
Ou
seja, o Estado Brasileiro institucionalizou que a implantação de melhores
práticas de governança corporativa será critério para diferenciar quais
empresas serão consideradas éticas para os fins de contratar com os governos de
um lado, criando uma nova autorregulação.
Assim como no início dos anos 2000, a criação do Novo Mercado parecia que não vingaria e se tornou o padrão de excelência para uma empresa que quisesse fazer um IPO. Parece que a recomendação (ou será uma exigência?) de fundação de um escritório de compliance instituído pelo Decreto 8240 e seus efeitos práticos na implantação paulatina de governança corporativa nas empresas criará um novo padrão de excelência empresarial, uma vez que significará o estabelecimento de um novo filtro de seleção do risco de contratação empresarial.
E aquelas empresas que se anteciparem e
buscarem se adequar terão criado uma oportunidade de se destacarem no mercado
e, com isso, terão melhores condições de competir e vencer, ainda mais nos
cenários de crise econômica que estamos vivendo.